geração z, escapismo e o resgate de tendências
publicado em 18 de outubro de 2020 na revista digital @revistaeu.genia
Estamos em 2020. As duas últimas décadas foram marcadas pelo intenso avanço tecnológico, pela rapidez de informação e ritmo de vida cada vez mais acelerado. No universo da moda não poderia ser diferente — vimos novas profissões, como as influenciadoras, nascendo e novos discursos, como a moda sem gênero, sendo colocadas em pauta. E dentro desse furacão de mudanças está inserida a nova geração, a tal da Geração Z.
Os jovens nascidos entre 1998 e 2010 já cresceram conectados e com um olhar para a tecnologia e inovação. Não é à toa que já sejam reconhecidos por sua identidade fluida, rejeição pelas normas e tradições passadas e presença massiva no universo digital — seja através de filtros do instagram, avatares ou conteúdo criado “na rede social ao lado”. Com interesse por temas contemporâneos como sustentabilidade e um forte engajamento em causas sociais, parece que nada vai parar os Gen Z rumo ao futuro. Ou quase nada.
Com o surgimento da pandemia do Covid-19 e a necessidade do isolamento social, os jovens entre 10 e 20 anos estão tendo que lidar com uma formação conturbada e com diversas incertezas a respeito de seu futuro. Mas se é para frente que este grupo costuma olhar, é no passado que eles têm encontrado a solução para se expressar e enfrentar o cenário mundial atual.
Um indicativo desse direcionamento foi o mais recente relatório sobre o futuro da cultura jovem da revista Dazed, que aponta a nostalgia dessa geração pela cultura dos anos 90, percebida tanto em sua aparência quanto em seu comportamento e atitude. Alguns especialistas, como a diretora de Mindset da WGSN, Jennifer Edwards, já afirmam que os Gen Z têm a “febre dos 90s”. Além disso, ao utilizarmos a moda como dispositivo para um estudo sociológico, torna-se perceptível o movimento de resgate de tendências que ultrapassam a estética e sinalizam uma intenção em se aproximar de certos ideais do passado, como é o caso do estilo cottagecore, uma ode ao estilo de vida bucólico, ou mesmo das estampas tie-dye e smile, tão relacionadas aos anos 70 e ao movimento hippie.
Essa busca pelas décadas passadas não é em vão: ideias que remetem ao simples, analógico, artesanal ou até mesmo a uma estética “feliz” se tornaram uma válvula de escape para o momento que estamos vivendo. E isso não é ruim — para o filósofo Gaston Bachelard, o escapismo não significa uma fuga da realidade, mas sim a capacidade de mediar a relação entre a humanidade e o mundo à sua volta, podendo trazer benefícios com a recriação e arranjo da realidade. Não é por acaso que essa prática é recorrente ao longo da História, como é o caso do movimento Arts and Crafts ou do Romantismo literário no século XIX, ambos constituídos pelo desejo de transformar positivamente a realidade existente.
É verdade que não é a moda — e muito menos um vestido floral no estilo camponesa — que trará a solução para os problemas da vida moderna. Ainda assim, em um cotidiano tão árduo como o que estamos inseridos na atualidade, resgatar uma peça de roupa ou linguagem do passado nos permite ter contato com nossas origens, transmitindo uma sensação de segurança e coragem para seguirmos em frente. Além disso, assumir uma “estética da felicidade”, repleta de miçangas coloridas e rostinhos amarelos, é capaz de transformar nosso ânimo e cuidar da nossa saúde mental em momentos mais difíceis. E assim como a nova geração tem nos ensinado, vamos construindo o futuro com uma memória de cada vez.